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Um lugar para chamar de meu. Meu sítio virtual. Meu cadinho.

Lugar de gritos e sussurros. Pedaço de mim.

'Onde eu possa juntar meus amigos, meus discos e livros...'

sexta-feira, 30 de março de 2012

obrigada!

ALEXANDRA MORAES
Estranho este texto com seu nome que não é seu nome. Que me conste, você éAmélia, não MoraesAmélia é mais bonito que Moraes, só que a canção popular valorizou sobremaneira uma certa Amélia, submissa e bondosa.  E se tem algo que o homem não quer para si é submissão. A bondade até vai, mas devidamente relativizada e adaptada aos nossos interesses. O animal humano é feio.

Mas este texto tem seu nome porque as informações me chegam e a indiferença não faz parte de mim, infelizmente. Não vai neste lamento o autoelogio de que me acusaram no ano passado. A cultura da indiferença nos faz caminhar livres, leves e soltos nas academias – as de ginástica e aquelas onde se fala em sintagmas e Franz Kafka; donde se conclui ser a indiferença uma virtude, não um pecado.  Sei que o exótico indivíduo acusador não merece qualquer crédito, dada a enorme carga neurótico-psicótica. Mas acusações sempre incomodam, não importa muito quem as faça.

Esqueçamos, porém, esse tipo de gente e voltemos a você, Alexandra Amélia. Como não me sinto integrante autêntico das duas academias, gostaria, mesmo à distância, de segurar suas mãos, abraçá-la e ajudá-la a tocar o barco – este barco enorme sempre nos ameaçando de naufrágio. Gostaria de dizer-lhe que estamos todos nesta viagem compartilhada, a desviar das pedras e maremotos. Estamos todos aqui, com as sensações nascidas dos séculos – sensações bobas de eternidade, maldosamente inculcadas em nós.

Somos e não somos eternos. Não o somos nesta carne cultuada pela Moderna Filosofia da Mulher Melancia. Mas somos eternos nestes textos que podem ficar, que podem até ser lidos no ano 2.999. É claro que nossa carne não estará neste planeta azul em 2.999. Não se sabe, inclusive, se haverá ainda planeta azul em 2.999. Mas se forem dignos nossos escritos, eles ficarão, fugirão das batalhas finais, serão republicados emK-Pax, onde não há generais, chefes, coordenadores, advogados, leis, revólveres e prisão.

Por tudo isso, Alexandra Amélia, carpe diem! Volte à floresta, abrace a essência da vida. Continue a fazer extraordinário esse tempo terráqueo.

22.03.12


(PEIXOTO FILHO, Fernando V.. In: Adjunto Verbal, 22/03/2012)


quinta-feira, 22 de março de 2012

shei lá



irmã, cais, refúgio, enseada

tudo aquilo me salva e me resguarda

amor, poesia, amendoeira, calçada

saudade...

evoé!!

o dia hoje foi recheado. 
emoções tantas e tão profundas que nem sei!!
assisti ao filme 'a pele que habito'. nesse momento de descontrução do meu corpo, de mudanças tão pesadas, fui inundada de um monte de silêncios, não sei me responder.não me reconheço, mas sou eu mesma, aquela, a outra. a que foi sem nunca ter sido. porcina, teúda e manteúda de mim mesma.
me refiz, respirei, tomei banho, bebi uma caneca extra-grande de café, sentei diante do computador e... eu que adoraria fugir pra k-pax, 'pegar carona nessa cauda de cometa', me vi descrita de forma tão sensível, com tanto afeto...
ah! obrigada, moira, muito obrigada por trançar o meu destino com pessoas assim!!!
evoé, almodovar!!
evoé, fernando!!

resposta

ando costurando versos,
tecendo imagens,
bordando sons. 
tenho feito bainhas
nos meus medos.


meu corpo foi desconstruído,
esse espaço que habito
não é mais o que eu conhecia bem,
há espaços e silêncios nunca
d'antes revelados,
há ausências.
há outras presenças.
e há o mesmo,
e há o medo.


minha nau é nova agora,
novos rumos
novos ventos.


diante do novo,
há o susto. 
diante do susto, 
há o abrigo.
"viagem compartilhada,
a desviar das pedras e maremotos."*


tenho trançado poemas
nos meus avessos,
agora só me interessa
o que é de dentro,
o que habita sob,
o que existe entre,
o que respira por,
o que dispensa o mas...


descosturada,
me refaço com carinhos,
renda feita com amores,
com palavras,
poemas
e flores.


*fernando vieira peixoto filho 

eu

sou alexandra por soberba:
minha mãe me pretendia grande
(meu pai me preferia dele),
olimpia e felipe tupiniquins
me deram alicerces,
fundaram-me com maestria,
ser grande é coisa pra alguns


sou amélia por herança.
sangue de avó 
que me corta o peito,
que corre nas veias,
que me lembra que ser mulher
é dessas coisas pra poucos


sou moraes por ofício,
como o poetinha da ilha,
como conchita e dulcina,
moraes é a outra,
é a que se supera,
é a que não espera,
avançar é para todos,
traçar seu destino
é pr'os que sonham.

segunda-feira, 12 de março de 2012

de agulhas e dedais

ando envolta em avessos.
mulher cosendo bainhas da alma,
pespontando idéias
"crochê das coisas... intervalo... nada..."*


faço pés-de-meia para aquecer a alma,
paninhos de crochê para o espaldar das costas
tricoto gorros de guardar pensamentos


ando reinventando, 
em mim,
a princesa que furou o dedo na roca
a velha que foi incomodada pela mosca


ponto e cruz
bordados
linhas e agulhas nos dedos
dedais nos olhos
e o avesso é o lado de fora


*in livro do desassossego, fernando pessoa

não fui eu que parti, foi você que ficou

a vida nos leva pra longe.
não é verdade.
quando queremos ficar juntos,
nós ficamos.


não é a vida que nos afasta,
somos nós que decidimos ir,
não que seja fácil, mas é assim.
desse jeito.


a vida nos toma pelas mãos
e nos conduz por novos caminhos,
mas ela não tira ninguém de perto de nós, 
essa não é a condição.


a vida nos leva,
mas nem todos vão junto.
não fui que parti,
foi você que ficou...


pena.
muita pena...

terça-feira, 6 de março de 2012

dona vida

vez em quando, dona vida,
essa louca que nos leva, sempre e sempre
sem perguntar se queremos ir ou se queremos ficar,
essa louca, vez por outra,
me sufoca,
me enche de vontade de ficar na toca,
de não ser, de não ir e de não ficar,
mas dona vida, guia presunçosa,
me segura pelas mãos e me arrasta,
me machuca, me maltrata,
mas depois, como um cão vadio,
lambe minhas feridas, se aninha aos meus pés,
me olha com seus olhos compridos
e me convence a continuar.
e eu vou, e vou feliz,
porque quando se deita e se aninha,
dona vida, fica assim pequenininha,
e me faz crer que precisa de mim,
e eu carente, procuradora de estrelas,
domadora de ondas, a pego no colo,
beijo suas bochechas, arrumo seus cabelos e vou.
vou feliz achando que sou eu que a levo
quando na verdade é ela que me carrega.
dona vida, seu colo quente é todo meu...

sexta-feira, 2 de março de 2012

uma mulher olhando o mar

porque eu sou uma mulher olhando o mar
porque eu sou um mar em forma de mulher
porque o mar e eu somos um
porque eu sou sal e areia


e porque há o mar
há o mar dentro de mim
há o mar em volta de mim
há o mar mergulhado em mim


e porque as ondas me lambem as pernas
me molham as coxas
me esquentam
me varrem
me levam


e porque eu sou uma mulher olhando o mar
e porque o mar me olha;

hoje

é porque hoje eu voltei um pouco mais, um pouco mais pra dentro de mim, olhei meus avessos, arrumei a costura, pespontei a bainha, me vi de novo.
soltei alguns poemas que agora brincam no caderno sobre a mesa, ouvi as canções que me fazem ser quem sou.
é porque, hoje, eu me fiz caber no incabível!!

de dentro pra fora

de dentro.
do fundo,
da última gavetinha,
escondidinho.


tive que remexer nos guardados,
sacudir a alma,
virar do avesso,
e descobrir que é assim,
de dentro,
que eu me mostro.


hoje juntei receita pra soltar poema preso,
com doses cavalares de lira clariceana,
abri meus baús, me espantei
e me espanei
e me varri
e me achei.


esta sou eu,
esta que se rasga de amor,
que se faz de forte,
que ficou amiga da morte,
que se acha por dentro,
que tem medo, mas não se cala.


esta sou eu,
esta que costura avessos,
que faz ponto e pesponto,
e flores de chita,
e roda saia
e canta
e dança
e grita.


prazer.