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Um lugar para chamar de meu. Meu sítio virtual. Meu cadinho.

Lugar de gritos e sussurros. Pedaço de mim.

'Onde eu possa juntar meus amigos, meus discos e livros...'

quinta-feira, 31 de março de 2011

sem título XIII

é amanhã
embora eu desejasse apenas
esperar pelo depois de amanhã
apesar da minha vontade
de apenas
me sentar ao lado das
camisas dobradas
é amanhã

queria apenas a metafísica dos chocolates!

segunda-feira, 28 de março de 2011

minha religião é o amor, não frequento templos, não me ajoelho diante de altares, não aceito dogmas. simplesmente amo, amo com tanta intensidade e despreendimento que não preciso de reconhecimento e nem aguardo reciprocidade. amo simplesmente porque me vejo no outro. 
amo porque é assim que sou.
eu sou amor.


como toda religião tem sua oração, eis aqui meu padre nosso: 



Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar só por amar: aqui... além...
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente...
Amar!  Amar! (...) 





Florbela Espanca

das tristezas

tristes não são as palavras
mas os olhos de quem lê.

sem título XII

longe, lá bem longe,
tem um rio de águas
claras e mansas
que se esparrama na
areia pra gente brincar

longe, lá bem longe,
tem um baobá de tronco
forte que se derrama
em sombras e folhas
pra gente deitar

vem

vem que tenho medo
deita ao meu lado
faz um cafuné
e diz que tudo vai ficar bem

vem que teu abraço
me protege de tudo
me aperta bem forte
e diz que tudo vai ficar bem.

O que mata

O que mata não é o câncer,
é o descaso, é a falta de afago,
é o medo no olhar do outro.

O que mata não é o câncer,
é não ter atendimento,
é ficar na fila na chuva,
é esperar
- bem quietinho -
que alguém lhe veja.

O que mata não é o câncer,
é o médico mercantilista
que cobra os olhos da sua cara
como pagamento.

O que mata é a incerteza no atendimento,
é a certeza do adiamento,
é a falta de acolhimento.


"E mesmo que nada funcione Eu estarei de pé, de queixo erguido"*


 * Pitty



sem título

entre as flores a noite cai
uma estrela pisca
um homem passa
uma lua corre e
um astronauta passeia
no grande nada

entre dores um homem vai
imerso em tudo
o homem chora
uma onda explode
uma pedra rola
e a nave vai

Enquanto todos dormem eu sonho. Ruas com flores azuis, casas com janelas amarelas e telhados vermelhos.
Lá não há fome, medo ou angústias.
Lá todos são felizes e ninguém está doente.
Lá qualquer um pode ser qualquer coisa e o perfume das flores invade o ar.

Medo IV

tantas ruas e
esquinas,
tantos medos e
receios.
paro sempre nos sinais
abertos
sigo fechada nos
demais

Do ato de ter fé.

Queria acreditar impunemente em alguma coisa divina e misteriosa, sabedora de todas as cores e de todas as dores do mundo.
queria muito acreditar.
Mas só consigo acreditar em quem me olha nos olhos e não abaixa o olhar.








vinte e sete de janeiro de dois mil e onze

domingo, 20 de março de 2011

quintaneando

"Frescor agradecido de capim molhado

Como alguém que chorou

E depois sentiu uma grande, uma quase envergonhada alegria

Por ter a vida

continuado..."

(Quintana, M. Pequeno Poema de Após a Chuva. IN: Baú de Espantos. São Paulo:Editora Globo, 2006, p. 64)

sem título XI

Sem compaixão.

Sem dó nem piedade.

Sem vírgulas ou parágrafos.

A vida segue, e nós seguimos nela, sempre, até o fim.





sábado, 19 de março de 2011

(trecho)


Paranóia

Raul Seixas

Quando esqueço a hora de dormir
E de repente chega o amanhecer
Sinto a culpa que eu não sei de que
Pergunto o que que eu fiz?
Meu coração não diz e eu...
Eu sinto medo!
Eu sinto medo!

Se eu vejo um papel qualquer no chão
Tremo, corro e apanho pra esconder
Com medo de ter sido uma anotação que eu fiz
Que não se possa ler
E eu gosto de escrever, mas...
Mas eu sinto medo!
Eu sinto medo! 

Medo III

Miedo

Pedro Guerra/Lenine/Robney Assis

Tienen miedo del amor y no saber amar
Tienen miedo de la sombra y miedo de la luz
Tienen miedo de pedir y miedo de callar
Miedo que da miedo del miedo que da

Tienen miedo de subir y miedo de bajar
Tienen miedo de la noche y miedo del azul
Tienen miedo de escupir y miedo de aguantar
Miedo que da miedo del miedo que da

El miedo es una sombra que el temor no esquiva
El miedo es una trampa que atrapó al amor
El miedo es la palanca que apagó la vida
El miedo es una grieta que agrandó el dolor

Tenho medo de gente e de solidão
Tenho medo da vida e medo de morrer
Tenho medo de ficar e medo de escapulir
Medo que dá medo do medo que dá

Tenho medo de acender e medo de apagar
Tenho medo de esperar e medo de partir
Tenho medo de correr e medo de cair
Medo que dá medo do medo que dá

O medo é uma linha que separa o mundo
O medo é uma casa aonde ninguém vai
O medo é como um laço que se aperta em nós
O medo é uma força que não me deixa andar

Tienen miedo de reir y miedo de llorar
Tienen miedo de encontrarse y miedo de no ser
Tienen miedo de decir y miedo de escuchar
Miedo que da miedo del miedo que da

Tenho medo de parar e medo de avançar
Tenho medo de amarrar e medo de quebrar
Tenho medo de exigir e medo de deixar
Medo que dá medo do medo que dá

O medo é uma sombra que o temor não desvia
O medo é uma armadilha que pegou o amor
O medo é uma chave, que apagou a vida
O medo é uma brecha que fez crescer a dor

El miedo es una raya que separa el mundo
El miedo es una casa donde nadie va
El miedo es como un lazo que se apierta en nudo
El miedo es una fuerza que me impide andar

Medo de olhar no fundo
Medo de dobrar a esquina
Medo de ficar no escuro
De passar em branco, de cruzar a linha

Medo de se achar sozinho
De perder a rédea, a pose e o prumo
Medo de pedir arrego, medo de vagar sem rumo

Medo estampado na cara ou escondido no porão
O medo circulando nas veias
Ou em rota de colisão

O medo é do Deus ou do demo
É ordem ou é confusão
O medo é medonho, o medo domina
O medo é a medida da indecisão

Medo de fechar a cara
Medo de encarar
Medo de calar a boca
Medo de escutar
Medo de passar a perna
Medo de cair
Medo de fazer de conta
Medo de dormir
Medo de se arrepender
Medo de deixar por fazer
Medo de se amargurar pelo que não se fez
Medo de perder a vez
Medo de fugir da raia na hora H
Medo de morrer na praia depois de beber o mar
Medo... que dá medo do medo que dá
Medo... que dá medo do medo que dá


O Medo II

Como faço para meu corpo entender que nem tudo o que reluz é ouro?
Como faço para minha cabeça entender que nada termina antes do final?
Como faço para compreender o incompreensível?
Como?

São tantas as perguntas e tão poucas as respostas.
São tantos os caminhos e tão ruins as estradas.
São tantos os desafios e tão grande o cansaço.
Tantos.

O medo I

Como dizia minha mãe...

                                    Quem tem cu , tem medo!!!

quinta-feira, 17 de março de 2011

Se a carapuça couber...

I
Juízo anatômico dos achaques que padecia o corpo da República em todos os membros, e inteira definição do que em todos os tempos é a Bahia.
Que falta nesta cidade?... Verdade.
Que mais por sua desonra?... Honra.
Falta mais que se lhe ponha?... Vergonha.

O demo a viver se exponha,
Por mais que a fama a exalta,
Numa cidade onde falta
Verdade, honra, vergonha.

Quem a pôs neste rocrócio?... Negócio.
Quem causa tal perdição?... Ambição.
E no meio desta loucura?... Usura.

Notável desaventura
De um povo néscio e sandeu,
Que não sabe que perdeu
Negócio, ambição, usura.

Quais são seus doces objetos?... Pretos.
Tem outros bens mais maciços?... Mestiços.

Quais destes lhe são mais gratos?... Mulatos.


Dou ao Demo os insensatos,
Dou ao Demo o povo asnal,
Que estima por cabedal,
Pretos, mestiços, mulatos.


Quem faz os círios mesquinhos?... Meirinhos.
Quem faz as farinhas tardas?... Guardas.
Quem as tem nos aposentos?... Sargentos.


Os círios lá vem aos centos,
E a terra fica esfaimando,
Porque os vão atravessando
Meirinhos, guardas, sargentos.


E que justiça a resguarda?... Bastarda.
É grátis distribuída?... Vendida.
Que tem, que a todos assusta?... Injusta.


Valha-nos Deus, o que custa
O que El-Rei nos dá de graça.
Que anda a Justiça na praça
Bastarda, vendida, injusta.


Que vai pela clerezia?... Simonia.
E pelos membros da Igreja?... Inveja.
Cuidei que mais se lhe punha?... Unha


Sazonada caramunha,
Enfim, que na Santa Sé
O que mais se pratica é
Simonia, inveja e unha.


E nos frades há manqueiras?... Freiras.
Em que ocupam os serões?... Sermões.
Não se ocupam em disputas?... Putas.


Com palavras dissolutas
Me concluo na verdade,
Que as lidas todas de um frade
São freiras, sermões e putas.


O açúcar já acabou?... Baixou.
E o dinheiro se extinguiu?... Subiu.
Logo já convalesceu?... Morreu.


À Bahia aconteceu
O que a um doente acontece:
Cai na cama, e o mal cresce,
Baixou, subiu, morreu.


A Câmara não acode?... Não pode.
Pois não tem todo o poder?... Não quer.
É que o Governo a convence?... Não vence.


Quem haverá que tal pense,
Que uma câmara tão nobre,
Por ver-se mísera e pobre,
Não pode, não quer, não vence.


Gregório de Mattos e Guerra

terça-feira, 8 de março de 2011

Dia Internacional da Mulher

Com licença poética
(Adélia Prado)


Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo.  Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
— dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.

terça-feira, 1 de março de 2011

Abstinência I

Só parei de fumar.
Mas parece que parei de existir...

Da série: crise de abstinência

Mulher ao espelho
Cecília Meirelles


Hoje que seja esta ou aquela,
pouco me importa.
Quero apenas parecer bela,
pois, seja qual for, estou morta.



Já fui loura, já fui morena,
já fui Margarida e Beatriz.
Já fui Maria e Madalena.
Só não pude ser como quis.



Que mal faz, esta cor fingida
do meu cabelo, e do meu rosto,
se tudo é tinta: o mundo, a vida,
o contentamento, o desgosto?



Por fora, serei como queira
a moda, que me vai matando.
Que me levem pele e caveira
ao nada, não me importa quando.



Mas quem viu, tão dilacerados,
olhos, braços e sonhos seus
e morreu pelos seus pecados,
falará com Deus.



Falará, coberta de luzes,
do alto penteado ao rubro artelho.
Porque uns expiram sobre cruzes,
outros, buscando-se no espelho.